Homo Faber Fellowship:
Vanessa Barragão & Yaroslava Shkurat
Design têxtil - Portugal

Mestre artesã: Vanessa Barragão, design têxtil, Portugal

Aprendiz: Yaroslava Shkurat, Ecole Duperré, Ucrânia

Upcycling de resíduos no âmbito do design têxtil de Portugal até à Ucrânia; descubra esta dupla com uma filosofia em comum.

No seu atelier no sul de Portugal, a designer têxtil, Vanessa Barragão realiza tapeçarias artesanais altamente criativas a partir de têxteis reciclados. As suas peças demonstram o seu domínio de técnicas tradicionais como o gancho de trava, o croché e feltro e a maneira como as utiliza de forma contemporânea para transmitir mensagens importantes sobre as ameaças atuais que o nosso planeta enfrenta. A jovem designer têxtil ucraniana Yaroslava Shkurat terminou recentemente um curso de bordados na Ecole Duperré em Paris, após seis anos de estudos de tecelagem e tapeçaria em Lviv. Fascinada pela tecelagem de têxteis a partir de tecidos desperdiçados ou usados, colaborou recentemente com um designer de moda para criar uma coleção de têxteis únicos.

Yaroslava: O que despertou o seu interesse pelo design têxtil?

Vanessa: Estudei design de moda em Lisboa, mas percebi rapidamente que não era para mim. Quando era criança, desenhava muito e gostava de fazer croché, que os meus avós me ensinaram. Por esse motivo, durante o meu mestrado comecei a explorar mais o mundo dos têxteis. Nessa altura, fiz a minha primeira tapeçaria. Quando terminei os meus estudos, fui trabalhar para uma fábrica de têxteis no Porto e criava peças nos meus tempos livres como hobby. Abri o meu primeiro atelier em 2018, altura em que comecei a receber mais encomendas.

Vanessa: Porque motivo escolheu o design têxtil?

Yaroslava: Quando era pequena, interessava-me por pintura e, mais tarde, decidi inscrever-me numa escola de arte. Estava a tentar escolher o departamento e, como adorava cores, o professor sugeriu a tecelagem. É semelhante à pintura, pois permite-nos brincar com as cores e com as texturas. Depois especializei-me em tapeçaria.

Yaroslava: O que tem de especial o seu atelier em Albufeira?

Vanessa: Recentemente mudei para um atelier maior, para ter espaço para mais colaborações. Quero criar uma comunidade artística aqui no sul de Portugal – um espaço de intercâmbio, de conversas – fiquei inspirada com a cena artística vibrante do Porto e agora tenho as instalações para concretizar algo semelhante. A técnica que mais utilizo é o tufagem manual, o qual requer grandes teares, pelo que o espaço é essencial. Voltei para Albufeira porque a minha família é daqui, pela sua luz natural e pelo oceano à minha porta.

Vanessa: A Ucrânia tem alguma tradição de tecelagem que a tenha influenciado?

Yaroslava: Sim, a parte ocidental da Ucrânia é conhecida pela tecelagem artesanal tradicional. Existem muitas ovelhas nessa zona e os artesãos fazem tapetes com a lã.  É muito diferente da tecelagem contemporânea, mas é inspirador ver os antigos teares manuais a serem utilizados.

Yaroslava: Utiliza resíduos de tecido para as suas tapeçarias. Como é que esta ideia surgiu?

Vanessa: Compro restos de fábricas de têxteis do norte de Portugal. Tive essa ideia quando estava a trabalhar numa fábrica de têxteis no Porto e vi a quantidade de desperdício que existia. Os têxteis já estão coloridos quando os recebemos – mas temos de os limpar, embalar e armazenar para estarem prontos a usar. Para a saúde do nosso planeta, precisamos de encontrar métodos de produção que sejam sustentáveis e a utilização de técnicas tradicionais proporciona uma solução criativa para a reciclagem de resíduos.

Vanessa: O que pretende transmitir com as suas criações?

Yaroslava: Quero mostrar às pessoas que não precisamos de estar sempre a produzir novos materiais, sendo que podemos utilizar o que temos disponível – via o upcycling e a reciclagem. Quero ilustrar como os materiais reciclados podem funcionar na alta costura, não devendo ser considerados "fora de moda".

Yaroslava: O que é que inspira as suas tapeçarias?

Vanessa: O meu fascínio pelo oceano com o seu mais belo ecossistema escondido debaixo da sua superfície. Adoro tornar o mundo marinho visível para mostrar as ameaças que enfrenta, tal como o branqueamento dos corais devido ao aquecimento global. Levar as minhas criações para a casa das pessoas, para museus e galerias é uma forma de mostrar às pessoas o que está a acontecer aos nossos oceanos e de as sensibilizar.

Vanessa: Qual é o seu sonho para o futuro?

Yaroslava: Ter o meu próprio atelier na Ucrânia, utilizando apenas materiais reciclados. Trata-se de um conceito que não existe atualmente na indústria têxtil ucraniana. Gostaria de inspirar esta abordagem com a realização de peças.

Yaroslava: Qual foi a principal razão para concorrer ao Fellowship?

Vanessa: Tenho sempre estagiários, normalmente durante períodos de três meses cada. Ajudamo-nos uns aos outros – isso dá-me a oportunidade de transmitir os meus conhecimentos e competências que fazem parte da cultura do meu país. Quando comecei, não sabia como gerir o meu próprio atelier e o meu próprio negócio – isso não é ensinado nas escolas. Quero dar as boas-vindas aos jovens criativos para virem ver cada parte do processo e experimentar – é isso que me motiva. Assim, se um dia quiserem abrir o seu próprio estúdio, terão uma ideia melhor de como o fazer.

Vanessa Barragão e Yaroslava Shkurat são uma das 21 duplas seleccionadas de artesãos estabelecidos e colegas que participam na primeira edição da Homo Faber Fellowship.

Saiba mais sobre o programa em michelangelofoundation.org